Blog Wasser Advogados: Hipoteca firmada pela construtora, a favor de agente financeiro, não atinge adquirente, terceiro de boa-fé

domingo, 19 de abril de 2009

Hipoteca firmada pela construtora, a favor de agente financeiro, não atinge adquirente, terceiro de boa-fé

OBRIGAÇÃO DE FAZER – PEDIDO DE LIBERAÇÃO DE HIPOTECA E OUTORGA DE ESCRITURA DEFINITIVA – HIPOTECA FIRMADA PELA CONSTRUTORA, A FAVOR DE AGENTE FINANCEIRO, NÃO ATINGE ADQUIRENTE, TERCEIRO DE BOA-FÉ

(TJSP)

BDI nº 34 - ano:2008 - (Jurisprudência)
ACÓRDÃO

Obrigação de fazer - Pedido de liberação de hipoteca e outorga de escritura definitiva - Bem oferecido em hipoteca pela construtora e, posteriormente, adquirido por compromisso de compra e venda - Unidade condominial quitada pela adquirente - Hipoteca firmada pela construtora, não atinge adquirente, terceiro de boa-fé - Direito do compromissário em ter a escritura definitiva outorgada.

Indenização por dano moral - Dano configurado em razão do descumprimento contratual - Redução do valor da indenização para R$ 7.600,00 - Recurso parcialmente provido.

Ilegitimidade “Ad Causam” - Vinculação da instituição financeira com o bem objeto da ação em razão da hipoteca - Legitimidade passiva de parte reconhecida.

Hipoteca - Ciência da instituição financeira de que os bens oferecidos em garantia seriam comercializados a terceiros - Inércia da instituição em deixar de notificar todos os condôminos a respeito da inadimplência da empresa - Aplicabilidade da Súmula 308 do STJ - Recurso improvido.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1.282.829-2, da Comarca de São Paulo, sendo apelantes Basic Engenharia Ltda. e Banco Bradesco S/A, e apelada Edna Santana.

Acordam, em Vigésima Primeira Câmara de Direito Privado, do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, por votação unânime, dar parcial provimento ao recurso.

Recurso de apelação interposto contra sentença que julgou procedente ação de obrigação de fazer, cumulada com pedido de indenização por danos morais.

Busca a empresa apelante a reforma da decisão ao argumento de que não agiu de má-fé ou com abuso de direito. Alega que a apelada tinha ciência do ônus hipotecário que recaía sobre o imóvel no momento de sua aquisição.

Aduz que não houve recusa em lhe outorgar escritura definitiva de venda e compra, entretanto, há hipoteca gravada em favor do Banco Bradesco que se nega em liberar as hipotecas dos imóveis alienados a terceiros, em razão do débito estar sendo discutido em juízo.

Sustenta que não restou comprovada a ocorrência de qualquer fato danoso a justificar o alegado dano moral. Diz que mera contrariedade gerada por descumprimento contratual não caracteriza dano moral.

Por fim, pede pela improcedência da ação e, alternativamente, a redução do valor da indenização por danos morais.

O banco, em suas razões recursais, argüiu ser parte ilegítima para figurar no pólo passivo da ação. Diz que seu compromisso foi firmado antes de a construtora alienar o bem à autora, que tinha conhecimento da hipoteca que recaía sobre o imóvel.

Argumenta que contratou com a construtora, não tendo conhecimento dos compromissos firmados pela empresa, por essa razão, não possuía elementos para notificar os compromissários da inadimplência. Por outro lado, o compromissário quitou o encargo sem exigir a anuência do banco.

Sustenta que a decisão nega vigência ao art. 585, III, § 1º do Código de Processo Civil.

Alega que no caso de hipoteca, mesmo com alienação e transferência de domínio, subsiste para o credor hipotecário o direito de promover a expropriação do bem hipotecado.

O recurso processou com a apresentação das contra-razões.

É o relatório.

Consta dos autos que em 18 de novembro de 2000, por instrumento particular de promessa de venda e compra e outras avenças a autora firmou contrato com a construtora Basic Engenharia para aquisição do apartamento pertencente ao Conjunto Residencial Porto Seguro (fls. 19/38), o qual foi aditado em 1º de dezembro de 2000.

Ao requerer a escritura definitiva foi informada pela construtora que o pedido não poderia ser atendido por se encontrar o imóvel hipotecado ao Banco Bradesco.

Ajuizada a presente ação, o pedido da autora foi acolhido, para que a hipoteca fosse cancelada com a outorga da escritura definitiva do imóvel a seu favor, condenando a empresa Basic Engenharia Ltda. ao pagamento de indenização fixada em R$ 12.000,00 (doze mil reais).

Inconformadas, buscam as rés a reforma da decisão.

Mas sem razão.

Primeiramente, analiso o recurso apresentado pela ré Basic Engenharia Ltda.

Alega a recorrente que no ato da assinatura do contrato era de conhecimento da apelada que o imóvel encontrava-se hipotecado.

Mas, também era de seu conhecimento a hipoteca que recaía sobre o imóvel, porém ao receber o valor referente à transação, não cuidou de repassá-lo à instituição financeira que financiou a obra. E, mesmo tendo conhecimento da hipoteca que recaía sobre o imóvel, assumiu o encargo de outorga à escritura em 180 dias, conforme se verifica da cláusula 8ª, parágrafo 2º.

Argumenta a empresa-ré que não houve recusa em outorgar a escritura, mas não obteve êxito em liberar a hipoteca junto à instituição.

Mas, nada há nos autos a comprovar essa afirmação.

Em relação ao pedido de danos morais, nada obsta a que a autora, pela intranqüilidade gerada pela negativa da empresa em outorgar-lhe a escritura definitiva do imóvel, requeira indenização por dano moral.

Não se pode perder de vista que a empresa possuía meios de solucionar a questão, transferindo à instituição financeira o valor que lhe foi repassado referente à venda da unidade objeto dessa ação.

Correta, pois, a decisão ao reconhecer o direito à indenização, pois houve reconhecimento da própria empresa do descumprimento contratual, fato que gerou intranqüilidade à autora e a impossibilitou de dispor do bem que adquiriu da forma que melhor lhe conviesse.

Um reparo, entretanto, merece a sentença.

O valor da indenização mostra-se elevado, as violações à intimidade, à vida privada, à honra e à imagem das pessoas, apresentam-se em diferentes situações de gênero, número e grau.

E, quando se trata de violações morais de ordem patrimonial estas se encontram situadas em menor grau de relevância, donde não ser possível cogitar de verbas elevadas.

É certo que o valor da indenização milita como forma de coibir a prática de tais atos pelo causador.

No entanto, não se pode confundir indenização com locupletamento.

No caso, o evento ocorrido é de ordem exclusivamente patrimonial, com repercussão na esfera moral, devendo o dano moral ser fixado em R$ 7.600,00 (sete mil e seiscentos reais).

Em análise ao recurso da instituição financeira, primeiramente há de deixar consignado que não há que se falar em ilegitimidade de parte.

A ação foi ajuizada contra a empresa com quem a autora firmou o compromisso de compra e a instituição financeira na qual o imóvel fora dado em hipoteca.

Nesse particular, houve-se com inteiro acerto a decisão, dada a vinculação da instituição recorrente pela hipoteca do bem objeto da lide, e a quem compete a liberação da hipoteca.

No mérito, alega a instituição-ré o mesmo argumento posto pela empresa recorrente, que no ato da assinatura do contrato a autora tinha conhecimento de que o imóvel encontrava-se hipotecado.

Mas, também era de conhecimento da instituição bancária que os apartamentos seriam alienados a terceiros.

E, embora o contrato de compromisso de compra e venda cientificasse os adquirentes dos imóveis da hipoteca em favor da instituição bancária, esta não agiu com cautela ao deixar de notificar a todos os condôminos a respeito da inadimplência da construtora.

Sobre essa questão a jurisprudência cristalizou-se na Súmula 308 do Colendo Superior Tribunal de Justiça, no sentido de que:

“A hipoteca firmada entre a construtora e o agente financeiro, anterior ou posterior à celebração da promessa de compra e venda, não tem eficácia perante os adquirentes dos imóveis.”

Em face do exposto, dá-se parcial provimento ao recurso para reduzir o valor da indenização para R$ 7.600,00 (sete mil e seiscentos reais).

Presidiu o julgamento o Desembargador Silveira Paulilo, e dele participaram os Desembargadores Conti Machado e Antonio Marson.

São Paulo, 31 de outubro de 2007

Maurício Ferreira Leite, Relator

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